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sexta-feira, 26 de julho de 2013

Ausência de elemento subjetivo especial / Furto de veículo automotor, por Cezar Roberto Bitencourt

"O digno e culto Professor Guilherme Nucci traz a público o seu entendimento sobre a questão prática do X EXAME da OAB, inclinando-se para o acerto da banca. Sustenta que, para os finalistas, o importante é a intenção, a vontade de agir desta ou daquela forma. Destacou, ainda, que no crime de furto o elemento subjetivo é (dolo), e ainda demanda no crime de furto (simples e qualificado) o elemento subjetivo específico, “para si ou para outrem”, e que, na hipótese do § 5º, demanda também “a finalidade de levar para determinado lugar”.
Destacou, ademais, que a intenção de Jane era levar para o Paraguai, onde não chegou a entrar. E a grande celeuma reside no fato de que “Jane para chegar à fronteira do Paraguai - que não cruzou -, precisou passar pelo território do Mato Grosso do Sul. E daí? Não era sua intenção levar o veículo para o Mato Grosso do Sul”.
Conclui o Prof. Nucci, em síntese, que como Jane não tinha intenção de vender o veículo no Mato Grosso do Sul, aplicar-lhe a qualificadora do § 5º, por ter passado por esse território seria consagrar uma forma indireta de responsabilidade penal objetiva (espero ter sido fiel na síntese), “vale dizer, ela passou casualmente pelo Mato Grosso do Sul...”.
Pois, caríssimo Prof Nucci, aqui reside nossa divergênccia, no plano puramente dogmático. Nóss fazemos uma distinção muito clara quanto ao elemento subjetivo desse crime, pois afirmamos que essa qualifiadora (§ 5º) não exige esse elemento subjetivo especial, e que, o aspecto da territorialidade “que venha transportar para outro Estado ou para o exterior” configura somente uma elementar normativa espacial do tipo, que é puramente objetiva, e não elemento subjetivo específico do tipo (ou do injusto), como parece pensar o digno Prof. Nucci. Aconteceu o fato, configou-se a elementar normativa. Ponto final.
Antes de mais nada, deve-se examinar um aspecto básico, que, na nossa concepção, funciona como um verdadeiro pressuposto desse crime, qual seja, a territorialidade, que é, ao mesmo tempo, uma elementar normativa espacial do crime de “furto qualificado de veículo automotor”. Esse aspecto é fundamental, na medida em que a qualificadora especial do § 5º somente se configura “se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior” (§ 5º do art. 155).
Pela construção da questão prática e da proposta exigida pela OAB, no entanto, constata-se que foi ignorada que a qualificação do crime não ocorre somente com o transporte da res furtiva “para o exterior”, mas também quando é transportado “para outro Estado”. Trata-se de elementar típica que não admite interpretação diversa. O elemento subjetivo não pode ser presumido, mas deve decorrer das próprias circunstâncias fáticas.
Com efeito, no enunciado da questão proposta afirma-se que Jane foi presa quando tentava cruzar a fronteira do Paraguai para negociar o veículo; por outro lado, a OAB afirma no “gabarito comentado”, que é o seu modelo de resposta esperada, “que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior, não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º” do artigo 155 do CP.
Na verdade, “para trnsportar para outro Estado ou para o exterior” não é elemento subjetivo específico do tipo, ao contrário do que parece interpretar o Prof Nucci, mas somente uma elementar normativa temporal, que se configura objetivamente, isto é, indepentenmente da existência de intenção especial. Assim, é irrelevante as razões pelas quais ela transportou pelo Estado do Mato Grosso do Sul, inclusive é indiferente que tenha passado “casualmente pelo Mato Grosso do Sul”, como afirma o eminente professor.
Com efeito, o legislador teria sido mais feliz exatamente se tivesse usado esse aspecto espacial como elemento subjetivo especial do injusto (preferimos esta terminologia àquela da teoria clássifica “dolo específico”), o que não fez.
Teria sido melhor elaborada a redação do § 5º se o legislador tivesse, por exemplo, se utilizado do tradicional elemento subjetivo especial do injusto, isto é, prevendo, como especial fim de agir, a venda ou transporte “para outro Estado ou para o exterior”. Como se sabe, o especial fim de agir, embora amplie o aspecto subjetivo do tipo, não integra o dolo nem se confunde com ele. Efetivamente, os elementos subjetivos especiais do injusto especificam o dolo, sem com ele se confundir. Não é necessário que se concretizem, sendo suficiente que existam no psiquismo do autor.
Na nossa concepção doutrinária, para a configuração da nova qualificadora, não basta que a subtração seja de veículo automotor: é indispensável que este “venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior”, segundo consta do § 5º, como ocorreu na hipótese proposta, sendo irrelevante, portanto, que não tenha entrado no Paraguai. Se o veículo automotor ficar na mesma unidade federativa, não incidirá a qualificadora, pois essa elementar integra o aspecto material dessa especial figura qualificada.
Com efeito, a incidência da qualificadora, nos termos legais, exige que o veículo tenha ultrapassado os limites territoriais do Estado-membro (como ocorreu, na hipótese proposta) ou do próprio território nacional, pois se trata de elementar objetiva espacial. Logo, o crime é qualificado nos termos do § 5º (transportar para outro Estado), como ocorreu no enunciado proposto.
Essa qualificadora cria um problema sério sobre o momento consumativo da nova figura delitiva. Afinal, pode um tipo penal apresentar dois momentos consumativos distintos, um no momento da subtração e outro quando ultrapassar a fronteira de um Estado federado ou do próprio País? Com efeito, quando o agente pratica a subtração de um veículo automotor, em princípio é impossível saber, com segurança, se será transportado para outro Estado ou para fora do território nacional. Assim, essa qualificadora somente se consuma quando o veículo ingressa objetivamente em outro Estado ou em território estrangeiro, independentemente da existência de algum fim especial.
Obs: este texto preteomente fazer um contraponto ao texto do prof. NUcci.
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