*Fonte: Estadão.
Cem mil bacharéis em Direito de todo o País aguardam ansiosamente a tarde desta quinta-feira para conferir o resultado preliminar da 1.ª fase do Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Caso sejam mantidos os índices de aprovação da última edição, menos da metade desse grupo de 103.943 pessoas estará apto para a 2.ª etapa. E, no fim da seleção, cerca de 15 mil deverão receber a carteira da Ordem e a autorização para exercer a advocacia.
A exigente peneira, realizada três vezes por ano, sempre traz à tona o argumento da legitimidade da OAB para definir quem pode exercer a advocacia. Os opositores questionam a constitucionalidade da prova e afirmam que as denúncias de fraude recentes enfraquecem a seleção. A Ordem, por sua vez, alega que é preciso manter um nível mínimo de qualificação de advogados e cursos jurídicos.
“O curso de Direito é barato para construir, caro na mensalidade e com atração social muito forte. Um prato cheio para quem pensa educação como fonte de lucro”, diz o ex-presidente da OAB Cezar Britto. Nos últimos dez anos, o número de graduações no País subiu de 442 para 1.096. Direito só perde em número de cursos para Administração e Pedagogia.
Para o consultor Reynaldo Arantes, de 46 anos, presidente da Organização dos Acadêmicos e Bacharéis do Brasil, uma das entidades que lutam pelo fim do exame, é “estranho” o fato de a margem de aprovados ser parecida em todas as edições. “As faculdades não melhoram nem pioram com o tempo? Isso só reforça o argumento de que a Ordem faz reserva de mercado”, diz Arantes, formado em 2005 pela Universidade do Oeste Paulista (Unoeste) e reprovado duas vezes pela OAB.
O professor da Faculdade de Direito da USP José Fernando Simão repudia a ideia da reserva de mercado. Para ele, “as boas universidades têm aprovação maciça” e o exame é necessário para controlar o acesso a um mercado “já inchado”. O País tem aproximadamente 700 mil profissionais registrados e forma todos os anos cerca de 80 mil bacharéis.
“Sonho com o dia em que não precisaremos mais do exame, porque aí o País terá um ensino jurídico de qualidade”, diz o presidente da comissão da OAB responsável pela seleção, Walter de Agra Junior. “É balela o papo de reserva de mercado. Se tivéssemos mais filiados, arrecadaríamos mais e seríamos mais poderosos. Mas nosso compromisso é com a cidadania.”
Graduada em dezembro pela FMU, Lívia Gavioli, de 22 anos, é a favor do exame como forma de selecionar pessoas capazes de “desburocratizar o Judiciário”. “Mas o exame não diz quem é bom profissional. Isso só pode ser observado na prática profissional”, diz Lívia, que tenta tirar a carteira da OAB pela primeira vez.
Em sua terceira tentativa, a ex-aluna da Unip Carla Pinheiro, de 42 anos, critica a obrigatoriedade do exame. “Tem gente que passa em concurso para promotor e não consegue tirar a OAB”, afirma. “A prova deveria ser condizente com o que aprendemos na faculdade.”
O Exame da Ordem foi instituído por lei em 1963 e era obrigatório só para bacharéis que não haviam feito estágio profissional. Em 1994, a Lei n.º 8.906, válida até hoje, transformou a prova em precondição para todos que desejam exercer a advocacia. Em 2007, o Conselho Federal da OAB deu início à unificação do exame, processo concluído no fim de 2009.
No primeiro exame totalmente unificado, organizado pelo Cespe/UnB há um ano, a OAB recebeu denúncias de vazamento de questões. A Polícia Federal instaurou inquérito, como parte da Operação Tormenta, para apurar a fraude. Após a investigação, 37 pessoas foram indiciadas. Segundo o delegado Victor Hugo Rodrigues Alves, responsável pela operação, ainda serão apuradas ilegalidades cometidas nas primeiras fases dos três Exames da Ordem de 2009. “O que vazou foi a prova. Professores ligados à quadrilha elaboraram gabaritos com base no caderno de questões que eles corrigiram. Encontramos gabaritos com data anterior à das provas.”
As fraudes levaram a OAB a romper com o Cespe e contratar a Fundação Getulio Vargas para elaborar o exame. Mas isso não impediu que outros problemas atrasassem ainda mais o cronograma da seleção. A 2.ª fase da segunda prova do ano passado (2010/2), aplicada em novembro, teve de ser corrigida de novo por causa de erros na divulgação do resultado. O Ministério Público Federal em São Paulo pediu na Justiça uma revisão minuciosa da prova. “A FGV não deu informações sobre a correção. Assim, os candidatos não sabem o porquê de sua nota”, alega o procurador Andrey Borges de Mendonça.
Às 17 horas de quinta-feira, a especialista em pesquisa de mercado Cintia Bragato, de 34 anos, espera encontrar seu nome na lista de aprovados para a 2.ª fase do Exame 2010/3, o que não ocorreu na última seleção por causa de 0,75 ponto. “Há um preconceito contra quem não passou no exame. É melhor tentar do que desistir, me frustrar e gastar com remédios.”
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