quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Cezar Britto: ano de 2009 não poderia ser melhor para advocacia brasileira

*Fonte: e-mail recebido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
                    Rio de Janeiro, 31/12/2009 - O ano de 2009 não poderia ter sido melhor para a advocacia, avalia o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto. O advogado deixará o comando da entidade em fevereiro, quando assumirá a nova diretoria. Ao Jornal do Commercio, ele fez um balanço da atuação da OAB em 2009 e principalmente de sua gestão, que teve a duração de três anos. Ele destacou o reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de que não existe sigilo para o advogado do processo, com a aprovação de uma súmula vinculante sobre o assunto, e chamou a atenção para as ações judiciais movidas pela instituição contra a lei aprovada recentemente pelo Congresso para alterar a sistemática relacionada ao pagamento de precatórios ou para que a Lei de Anistia não fosse aplicada aos torturadores. Outro ponto que frisou diz respeito ao Exame de Ordem, que foi unificado em todos os estados. O exame hoje é um balizador para a OAB, o Ministério da Educação (MEC), as instituições e os estudantes, inclusive designando em quais disciplinas a instituição está bem estruturada ou não. Com o exame, classificamos instituição por instituição, disciplina por disciplina, afirmou Britto. O presidente da Ordem anunciou a ampliação do certame. Vamos começar a fazer, agora em 2010, perguntas sobre direitos humanos, direitos fundamentais e ética profissional. Com isso vamos focar não tirar quem está investindo em colocar em seus currículos o conceito de humanidade, o que influenciará, a médio e longo prazos, as profissões do Direito já que o estudante terá esse conceito para passar no Exame de Ordem, afirmou.
                    Segue a íntegra da entrevista concedida pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto, para a repórter Giselle Souza do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro:
Qual avaliação o senhor faz da atuação da Ordem em 2009?
- Primeiro, destaco a consolidação do direito de defesa como sendo essencial à democracia. O dia 1º de fevereiro de 2009 marcou a história da advocacia, com a aprovação da Súmula Vinculante 14 (pelo Supremo Tribunal Federal). A orientação reconheceu definitivamente que não pode existir processo secreto para o advogado, que o Estado tem o dever de respeitar o cidadão, assim como o seu direito de defesa. Com essa súmula, baseada na lei que torna inviolável o direito de defesa e em diversas decisões proferidas pelo STF, iniciamos 2009 consolidando o dever de zelar pela democracia. Outra ação da OAB que consolidamos foi o combate à mercantilização do ensino jurídico. O ano foi decisivo na parceria OAB - Ministério da Educação pela busca do ensino jurídico de qualidade. Esse trabalho resultou no fechamento, pela primeira vez na história, de cinco cursos de Direito. Durante todo o ano, o MEC observou a opinião da OAB quando da criação de novos cursos no Brasil, primando sempre pela qualidade. Um dado importante que serviu para balizar o ensino jurídico, que teve sua conclusão também em 2009, foi o Exame de Ordem unificado. Todo o Brasil hoje está padronizado no que se refere à seleção para a advocacia. O exame hoje é um balizador para a OAB, o MEC, as instituições e os estudantes, inclusive designando em quais disciplinas a instituição está bem estruturada ou não. Com o Exame, classificamos instituição por instituição, disciplina por disciplina.
O que a OAB pretende fazer em relação às propostas em tramitação no Congresso que visam a extinguir com Exame de Ordem?
- O Exame de Ordem unificado extirpou a mercantilização do ensino jurídico brasileiro, pois apontou as várias instituições que praticam o que se denomina o conto do vigário educacional, ao prometerem a ascensão social pelo saber e ao fornecerem, em razão da ganância, um ensino de péssima qualidade. O Exame de Ordem apontou quais são as instituições que reprovam quase 100% de seus alunos. Evidentemente que essas instituições estão reagindo, pois querem o lucro fácil ao enganar o cidadão. Essas instituições pressionam o Congresso para que revoguem o certame. A OAB está alerta sobre essas pressões e tem atuado junto aos parlamentares demonstrando que a finalidade do Exame de Ordem não é a reprovação, mas exigir a qualidade técnica. Não poderia ser diferente. As carreiras jurídicas elencadas na Constituição têm na qualidade técnica a sua função e sua atividade. No Ministério Público e na magistratura a qualificação é aferida pelo concurso. Na advocacia é pelo Exame de Ordem. Hoje a prova é nacional. Isso foi algo consolidado nessa gestão. Quando assumi, o Exame de Ordem era feito de forma conjunta em sete estados do Nordeste. Termino a gestão com 27 estados realizando o certame.
Qual é a vantagem do exame unificado?
- Temos agora um diagnóstico confiável e único de todo o Brasil. Sabemos que a qualidade daquele que se formou no Amazonas é a mesma daquele que foi aprovado no Rio Grande do Sul. É importante até porque a carteira da OAB é nacional. O advogado pode atuar em todo território nacional. É importante, portanto, que a qualidade (da formação) seja a mesma. Com isso evitamos o que havia no passado, em que a pessoa se inscrevia para o Exame de Ordem na seccional onde achasse ser mais fácil passar. O Exame de Ordem unificado serviu até para quebrar alguns preconceitos. Por exemplo, dos dez estados que mais aprovam, sete são do Nordeste. Vamos começar a fazer, agora em 2010, perguntas sobre direitos humanos, direitos fundamentais e ética profissional. Com isso vamos focar em quem está investindo em colocar em seus currículos o conceito de humanidade, o que influenciará, a médio e longo prazos, as profissões do Direito já que o estudante terá esse conceito para passar no Exame de Ordem.
O senhor se despede da presidência da Ordem em janeiro. Que balanço o senhor faria de seu mandato?
- Destaco o enfrentamento ao Estado policial e à mercantilização do ensino jurídico. Combatemos isso com a centralização da OAB, que está mais aberta ao público e mais vinculada aos seguimentos da sociedade. Com a sociedade fizemos campanhas contra a violência e a criminalização dos movimentos sociais, assim como a favor da reforma política e combate à corrupção eleitoral. Podemos destacar a PEC do Calote (a proposta de emenda constitucional aprovada pelo Congresso criando nova sistemática para o pagamento de precatórios). O maior ataque ao Estado Democrático de Direito é feito pelo Estado ao transformar o Judiciário num apêndice do Poder Executivo, incapaz de controlar os abusos dos governantes. Fizemos uma passeata contra a proposta, mas o Congresso a aprovou. Ingressamos, então, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal.
A OAB também moveu ação contra a nova Lei do Mandado de Segurança. Qual é o objetivo da entidade?
- A ideia de se combater o fortalecimento do Estado, para que este não se sinta absoluto, envolve as ações judiciais. Uma foi a Adin contra a PEC do Calote. Outra foi contra a Lei do Mandado de Segurança. As duas normas têm o mesmo viés autoritário, em que o Estado pode tudo e o cidadão sequer pode recorrer ao Judiciário quando seus direitos são violados. O mandado de segurança existe para evitar a lesão do direito ou o direito líquido e certo. As duas ações têm o mesmo sentido: defender a cidadania e impedir a hipertrofia do Executivo de exercer o controle com autoritarismo.
Como o senhor avalia o Judiciário neste ano de 2009?
- O Judiciário em 2009 foi do CNJ. O Conselho Nacional de Justiça abriu corajosamente as portas do Poder Judiciário para a nação, expôs as falhas do Judiciário, mas também propôs soluções para corrigi-las, dentre eles a morosidade que provoca impunidade e estimula a prática de crimes. A impunidade é um dos maiores estímulos à corrupção e o crime do colarinho branco. Não é a tipificação do crime que o estimula, mas a certeza que não será punido. O CNJ vem apontando os erros e exigindo metas dos juízes. Termina o ano com gol de placa ao exigir também transparência dos atos administrativos.
Qual é o balanço em relação à ação movida pela entidade com vistas à abertura dos arquivos da ditadura?
- Essa foi outra ação importante no mandato: o compromisso da OAB com a verdade e a memória. Ingressamos com a ação direta de inconstitucionalidade contra toda a legislação que impedia a abertura dos arquivos da ditadura militar. No final, também com a ação para reconhecer que torturador não pode ser beneficiado com a Lei da Anistia. Centramos o mandato na ideia contra o fortalecimento do uso do Estado em detrimento do cidadão. O povo que não tem história se acovarda. O Brasil é grande. Tem que ter coragem de contar o que aconteceu, até porque anistia não é amnésia.
Como o senhor avalia a atuação da OAB no Congresso no ano que terminou?
- Intensificamos a presença da Ordem no Congresso Nacional. Compreendemos que a democracia precisa de um parlamento altivo e que não esteja subordinado ao Executivo. Nas audiências públicas, evidentemente quando o assunto dizia respeito à advocacia, pedimos para participar diretamente. A atuação preventiva é mais eficaz do que a reparadora. É melhor discutirmos as leis nas casas em que elas são feitas do que entrar depois com ação de inconstitucionalidade. Intensificamos muito esse trabalho preventivo no mandato, tanto que criamos uma comissão específica de acompanhamento legislativo da OAB.
A OAB criou uma série de comissões na sua gestão? Por quê?
- Demos voz às minorias. Criamos várias comissões que pontuaram a necessidade de assistência àqueles que necessitam. Exemplo são as comissões de promoção da igualdade, da criança e adolescente, do terceiro setor e de assuntos indígenas. Várias comissões foram criadas exatamente para dar condições aos excluídos do sistema. Com isso, melhoramos nossa comunicação com a sociedade. Também criamos uma ouvidoria. Com isso melhoramos nossa comunicação com os advogados da base. Enviamos atualmente 700 mil emails por dia a todos os advogados do Brasil.

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