terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Homem é proibido de entrar na sua cidade após ameaçar a irmã

*Fonte: e-mail recebido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
                    Brasília, 07/02/2011 - No começo, era uma desavença entre o agricultor Leonardo Durães e a irmã. Após ameaçar Sandra, ele ficou impedido de entrar em Buritis. Uma história curiosa vem do interior de Minas Gerais e mais parece uma história dos velhos filmes de bangue-bangue. Um homem está proibido de entrar na própria cidade. O agricultor Leonardo Durães não pode cruzar a divisa. "Se eu der um passo para lá, eu estou fora da lei", revela. Se pisar no município mineiro de Buritis, Leonardo estará descumprindo uma ordem judicial. "Eu me sinto no Velho Oeste, tipo um bandido, expulso da minha cidade", lamenta.
                    No começo era só uma desavença de família, uma rixa com a irmã, a funcionária pública Sandra Durães. "Ela costuma pisar nas pessoas", diz o agricultor. "Ele sempre foi custoso, sempre foi agressivo", ressalta a irmã. Mas a briga ficou feia, e o bate-boca parou na Justiça. "A minha irmã é bruta, está sempre querendo ser melhor do que todos", declara Leonardo. "Quando ele implica com uma pessoa, ele implica para valer", aponta Sandra. Até o dia em que ele ameaçou a irmã. "Ela se alterou comigo, eu me alterei com ela. Veio a convulsão em mim. Aí, eu não vi nada", conta o agricultor. A irmã chamou a polícia, e Leonardo foi preso.
                    A juíza de Buritis, Lisandre Figueira, mandou soltá-lo, mas, baseada na Lei Maria da Penha, de proteção à mulher, o proibiu de freqüentar o município durante seis meses. "Imediatamente, no outro dia, eu sai para Brasília, porque eles me pressionaram para sair do município", revela Leonardo.
                    "Foi uma decisão correta, porque, até então, o período em que eu tive um sossego, uma paz, foi esse período em que o Leonardo ficou afastado da cidade", declara a funcionária pública Sandra Durães.
                    Leonardo e a irmã Sandra não viviam na mesma casa. Ela mora na cidade. E ele, no campo, a sete quilômetros do centro de Buritis. Mesmo assim, ele teve que ir embora, porque a casa dele fica dentro dos limites do município. Com medo de ser preso, trancou tudo e nunca mais pisou no local.
                    Leonardo hoje mora perto de Brasília em Planaltina de Goiás, a 200 quilômetros de Buritis. Ele tem epilepsia e recebe R$ 600 de auxílio-saúde do governo de Minas Gerais, dos quais reserva R$ 180 para pagar o aluguel de um quartinho. O agricultor não se conforma de ter que gastar o dinheiro dos remédios. "A dona da cidade é a população, e não a juíza, porque ela é uma juíza, mas nós somos todos
iguais", critica o agricultor.
                    Será que a decisão da juíza tem base legal? Para o presidente nacional da Ordem de Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, não. "Na verdade, isso significa o crime de banimento que já foi abolido do nosso ordenamento jurídico na época da colônia. Uma decisão dessa natureza é tão absurda que, se a corregedoria local não corrigir, é necessário que o Conselho Nacional de Justiça corrija", afirma.
                    O Fantástico perguntou a dois importantes juristas se eles já tinham visto decisão parecida. "Definitivamente, não", afirma o advogado José Gerardo Grossi. "Nunca tive conhecimento de decisão semelhante".
                    Para o advogado José Gerardo Grossi, o precedente é grave. "A juíza hoje resolve afastar um cidadão do seu município. Amanhã, por que não afastá-lo do seu estado e posteriormente até do seu país, se dermos a essa juíza essa amplitude que ela tomou para aplicar medidas restritivas e pessoais?", critica.
                    O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso acha apenas que a juíza levou a Lei Maria da Penha ao pé da letra. "Sobre o ponto de vista legal, a decisão está correta. A juíza tem razão. A lei autoriza. Agora, é preciso verificar se esse dispositivo está conforme a Constituição", declara.
                    Para Velloso, há um exagero que viola o direito de ir e vir. A decisão poderia ter fixado um limite de afastamento entre os irmãos. "Podia ser 500 metros, um quilômetro, jamais, entretanto, determinar que ele passe a residir em outro município", destaca.
                    A juíza de Buritis argumenta que interpretou a lei para proteger a vítima. "A Lei Maria da Penha não estabelece qual a distância. O meu papel como juíza acima de tudo é a pacificação social. E foi com esse norte que eu decidi pelo afastamento do réu da comarca de Buritis", justifica a juíza Lisandre Figueira.
                    Como o endereço que consta nos autos é de Brasília, na verdade, a casa de uma prima, onde Leonardo se hospeda, quando trata da saúde, a juíza entende que ele vinha pouco a Buritis. "Os confrontos aconteciam quando ele vinha a Buritis. Então, para evitar isso, um prazo mínimo de seis meses. Eu acredito que a decisão tenha sido razoável", diz.
                    Leonardo não recorreu. Deixou passar o prazo de seis meses que expira nesta segunda-feira (7). Na semana que vem, ele vai pedir a um parente que vá ao Fórum e pergunte à juíza se ele já pode voltar. "Eu me sinto muito magoado com isso. É uma mágoa terrível dentro de mim. Uma discussão de irmãos me afastar do meu local, de dentro da minha cidade, criado desde a minha infância, onde eu cuidei dos meus avós, que foram os pioneiros de lá, até quando os dois se foram. Eu pretendo procurar a minha indenização de danos morais e ficar em paz no meu local lá", afirma o agricultor.
(A matéria foi veiculada neste último domingo, dia 6, no Programa Fantástico, da TV Globo)

Nenhum comentário:

Postar um comentário