*Fonte: TRT da 3ª Região.
O gerente de uma fazenda pertencente a uma empresa do ramo agropecuário procurou a Justiça do Trabalho pedindo a rescisão indireta do contrato de trabalho e o pagamento de indenização por danos morais. Segundo alegou o empregado, ele teria sido afastado dos serviços após 14 anos, sob a acusação injusta de apropriação de bens. Mas, após analisar as provas, o juiz Ronaldo Antônio Messeder Filho, em atuação na Vara de Trabalho de Araçuaí, entendeu que o empregado foi quem agiu de forma ilícita. Por essa razão, ele acolheu o pedido de aplicação da justa causa feito pela reclamada em reconvenção.
De acordo com a empregadora, o gerente, que era de sua total confiança, foi afastado das funções depois de ter um dos imóveis da empresa vendido por ele. A ré sustentou que o empregado sabia que os imóveis eram de propriedade e posse da empresa. E, de fato, ao apreciar as provas, o juiz estranhou o fato de o reclamante sustentar que os terrenos eram dele, mas nada informar sobre o modo de aquisição.
Em depoimento, o reclamante relatou que, quando da emancipação do município de Berizal, várias pessoas tomaram posse de terrenos vagos existentes na área. Foi o que ele também fez, tomando posse de um terreno entre 1993 e 1994. No entanto, essa versão não ficou provada. Uma perícia determinada pelo juiz para levantamento topográfico confirmou que o imóvel pertence mesmo à ré. O trabalho revelou que o terreno foi adquirido por uma pessoa por meio de doação do município de Taiobeiras, em 1991, e depois vendido para a ré, conforme contrato de compra e venda A inexistência de cadastros no Cartório de Registro de Imóveis foi justificada pelo fato de que a maioria dos imóveis de Berizal ainda se encontrarem sem registros.
Para o julgador, ficou claro que o reclamante se aproveitou do cargo de gerente para se apropriar de terrenos da ré. Ficou demonstrado que ele vendeu os terrenos ou os colocou em nome de laranjas. O juiz chamou a atenção para o princípio da continuidade imobiliária, que, no caso, ficou demonstrado em favor da reclamada, e não do reclamante. Os imóveis apareceram cadastrados a partir do ano de 2005 em nome dele no sistema do IPTU, sendo que a alegada doação não ficou provada em nenhum documento. O magistrado considerou tudo muito estranho, já que o reclamante havia falado que tinha a posse desde 1993/1994. Também chamou a atenção o fato de tudo ter acontecido no período em que o gerente assumiu o cargo de vice-prefeito da cidade (2005 a 2008). Ademais, o boletim de ocorrência policial juntado pelo próprio reclamante revelou dados que ajudaram o magistrado a desvendar os fatos. Em detida análise das provas, ele foi tecendo a rede que, no final das contas, não deixou dúvidas quanto ao esquema praticado.
"Trata-se, pois, de caso típico de grilagem de terras particulares", foi a conclusão a que chegou o juiz. Ele destacou que o reclamante era a única pessoa responsável por informar aos seus superiores, que residiam em outra cidade, sobre um eventual esbulho (ocupação) dos terrenos. Como ele mesmo procedeu ao esbulho, a reclamada demorou anos para perceber a invasão. O magistrado repudiou a possibilidade de usucapião dos imóveis esbulhados. É que a posse dos terrenos foi adquirida pelo reclamante de forma clandestina e com abuso de confiança, já que o empregado era responsável legal por fiscalizar e evitar possível turbação ou esbulho da posse.
Diante desse quadro, o que teve início como um pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho acabou se tornando uma declaração de resolução do contrato de trabalho, por justa causa, nos termos do artigo 482, alínea "a", da CLT. O pedido foi formulado pela reclamada por meio de reconvenção e acolhido pelo juiz sentenciante depois de tudo que apurou pelas provas.
Com relação à justa causa, o magistrado explicou que não há como exigir imediatidade, pois a matéria em debate envolve um alto grau de profundidade sobre documentos, fatos e pessoas. Ademais, a reclamada ajuizou ação de reintegração de posse e noticiou os fatos à Polícia por meio do boletim de ocorrência. Na sentença foi citada jurisprudência do TRT de Minas no mesmo sentido.
O juiz determinou a expedição de ofício ao Ministério Público Estadual para apurar eventual crime de improbidade administrativa cometida pelo reclamante no período em que ocupou o cargo de vice-prefeito do Município. As partes recorreram da decisão, mas o TRT de Minas negou provimento a ambos os recursos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário